segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Para os Pais

Para os Pais


ste texto destina-se essencialmente a todos os pais de homossexuais independentemente do sexo, mas também a todos nós que sendo homossexuais queremos ter um local onde possamos encontrar informações úteis sobre as reações típicas dos nossos pais quando confrontados com a nossa orientação sexual.

Porém, este texto é essencialmente destinado aos pais, que nele encontrarão respostas para alguns dos seus anseios. Esperamos com ele levar a que os pais possam ter um melhor entendimento da homossexualidade dos seus filhos, abandonando muitas ideias pré-concebidas e que nada têm a ver com a realidade dos fatos.

A esmagadora maioria dos pais deposita nos seus filhos todo um conjunto de expectativas, tentando projetar neles, muitas das vezes, aquilo a que eles próprios não tiveram acesso: uma carreira profissional de sucesso, um
casamento feliz, filhos, uma casa, etc... etc...

Ao tomarem conhecimento da homossexualidade dos seus filhos, apodera-se deles toda uma amálgama de sentimentos, onde se destacam o choque, que tem a sua origem em todo um conjunto de preconceitos percebidos da sociedade ao longo de muito tempo, alguns deles perfeitamente desajustados e totalmente errados.

Nos primeiros tempos os pais terão dificuldades em falar sobre o assunto sem serem assaltados por um misto de
dor e de ira. Normal.

Embora cada caso seja um caso e cada família seja diferente, e quer a descoberta da homossexualidade do filho
tenha sido acidental, dita cara a cara, pessoalmente ou por carta ou telefone, quer o filho seja adolescente ou adulto, quer tenha aceito a sua homossexualidade ou ainda se debata com ela, os pais poderão estar dispostos a ouvir ou ignorar. Todos, porém, se mostrarão invariavelmente preocupados, em maior ou menor grau, com o futuro do seu filho. Não seria melhor que nós não tivessemos descoberto ou que ele não nos tivesse dito nada?

Seria? Como pai ou mãe, será que se sentiria melhor se o seu filho lhe mentisse deliberadamente? Preferia conhecê-lo e amá-lo por uma coisa que ele na realidade não era? Ou prefere amá-lo conhecendo-o como ele é verdadeiramente?

Será que o fato de ele ter lhe contado não demonstra o quanto os ama, se preocupa convosco e necessita do vosso apoio?

Que fizemos nós para ele se vingar desta maneira?

Absolutamente nada!

Muitos dos pais tendem a ver no comportamento dos seus filhos atitudes de vingança para consigo próprios, baseados em conceitos deformados do tão famigerado 'conflito de gerações'. Este pressuposto de vingança, parte do princípio errado de que a orientação sexual do filho é uma escolha consciente que ele poderia mudar se quisesse. Não é exatamente assim.

Este sentimento de vítimas de vingança surge frequentemente misturado com outro de culpa, em que os pais se sentem culpados pela orientação sexual dos filhos.

Convirá também não esquecer que os homossexuais se encontram em todo o tipo de famílias, com os mais díspares ambientes, pelo que não é possível associá-los a um determinado tipo de família, que eventualmente contribuiria para a sua orientação sexual.

Quem terá levado o meu filho para 'esta vida'?

Antes de mais, 'esta vida' é coisa que não existe. Os gays (termo normalmente utilizado para identificar os homens homossexuais) e lésbicas são iguais a todas as outras pessoas: amam, trabalham, riem, choram... Somente amam e fazem vida com um companheiro do mesmo sexo.

Muitas vezes, muitos pais são levados a confundir um conjunto de pessoas que, também sendo homossexuais, têm uma vida identificada como "promíscua". No entanto a definição de "promiscuidade" e a aceitação de diversos comportamentos sexuais varia imensamente conforme as sociedades e mesmo conforme o papel das pessoas na sociedade. Provavelmente existirá uma maior porcentagem de gays e lésbicas que estejam preparados para ultrapassar de uma forma ou outras as regras da sociedade pois pelo simples fato de se assumirem como homossexuais já ultrapassaram uma barreira. Há outros que devido ao fato de a sociedade não os aceitar
como tal preferem levar uma vida escondida a qual propicia o sexo ocasional. Finalmente, existem também muitos homens e mulheres que têm relações de longa duração exclusivamente monogâmicas. Outros há ainda que são absolutamente uns verdadeiros tarados sexuais.... Mas se pensarmos um pouco chegaremos à conclusão que os casos apresentados também se aplicam aos heterossexuais.

Finalmente, ninguém levou o seu filho para lado nenhum. A sua orientação sexual é uma orientação dele próprio, que provavelmente já nasceu com ele, e não foi induzida por qualquer outra pessoa.

Esta opção sexual do meu filho vai fazê-lo ser discriminado?

Primeiro, a homossexualidade não é uma "opção", pois isso pressuporia a existência de uma escolha consciente e real por parte do sujeito homossexual, que não existe: ninguém escolhe ser homossexual, heterossexual, branco, negro, alto, baixo... Desta forma estamos perante uma orientação sexual, cuja existência não depende da vontade do sujeito homosexual e assenta em outros pressupostos.

Segundo, se o seu filho leva a sua vida de uma forma monogâmica, tendo um companheiro por quem sente afeto e levando uma vida como o resto das pessoas, existem menos chance de vir a ser discriminado, pois a sociedade brasileira é tem fama de ser relativamente tolerante. Existem leis anti-discriminação sendo aprovadas em vários estados, projetos de parceria sendo votados no Congresso Nacional e juristas defendendo o casamento gay e a adoção de crianças por esses casais. Aos poucos, o Brasil vai se adaptando a aceitar todos seus cidadãos igualmente, independentemente da sua orientação sexual.

Se, porém, o seu filho é, enquanto pessoa, exuberante, gostando do exibicionismo e do protagonismo, e junta a isso a sua orientação homossexual, então são maiores as chances de vir a ser discriminado, principalmente porque a sua homossexualidade é reconhecida pela sociedade de forma mais evidente. No entanto isto não quer dizer que o problema esteja exatamente no seu filho mas mais provavelmente na forma preconceituosa como a sociedade em geral encara a homossexualidade. Ser mais discreto pode facilitar a integração mas não é garantia de aceitação imediata: o que assusta a sociedade não são os comportamentos em geral mas sim (por enquanto) a homossexualidade em si.

Não se verá ele quando for mais velho, atirado para um canto, sem ninguém?

A esta questão existem três respostas possíveis:

Primeiro, esse risco de solidão é um risco inerente a qualquer um de nós enquanto seres humanos. Nenhum de nós está livre de ficar sozinho um dia;

Segundo, se o comportamento do seu filho é uma procura de encontros sexuais casuais sucessivos, então esse risco de solidão futura é bem maior (como acontece com qualquer pessoa), pois chegará o dia em que a sua atração física se desvanecerá e então será tarde para iniciar uma relação;

Terceiro, se devido à sua própria personalidade, formação moral e educacional, o seu filho arranjou ou pretende arranjar um companheiro estável, então os riscos de vir a encontrar-se só serão muito menores, pois os casais estáveis de homossexuais têm praticamente as mesmas condições de sobreviverem que os demais casais hetero. Tudo depende do sentimento, compromisso e empenhamento de ambos os membros do casal, em resolverem os problemas que no dia a dia lhes vão surgindo.

Não quero um filho meu assim... vou levá-lo ao psiquiatra!

Antes de mais nada convirá esclarecer que ser homossexual não é assim, nem assado. É uma orientação sexual como outra qualquer.

Seguidamente, o psiquiatra nada poderá fazer uma vez que o seu filho ao ser homossexual não padece de doença nenhuma. Note que as tentativas de 'transformar' homossexuais em heterossexuais não tiveram bons resultados.

Vale notar igualmente, que a homossexualidade hoje já não é considerada como de origem patológica e como tal não pode ser catalogada como doença.

Porém, o psiquiatra poderá ser uma ajuda preciosa no caso do seu filho se debater ainda com depressões e angústias relacionadas com a sua orientação homossexual. Aqui a ajuda será preciosa, pois o psiquiatra poderá ajudar o seu filho a melhor se encontrar a ele próprio e a melhor viver com a sua orientação sexual.

Esta atitude de ajuda será tanto mais importante se tivermos em consideração que a taxa de suicídios entre jovens homossexuais é mais elevada que entre os seus pares heterossexuais, precisamente devido a períodos de angústia e depressão que a sua orientação homossexual lhes provoca.

Que desgraça... e que irão dizer a família, os amigos e os vizinhos?

Em primeiro lugar não nos parece natural ter de sair contando a este ou àquele que o seu filho é homossexual. Alguém que conheça lhe veio alguma vez contar ser heterossexual? No entanto é natural que lhe venham contar do namorado ou o caso ou o casamento de um familiar, e nestas situações falar da situação do seu filho poderá ser mais complicado. Pior ainda é ser confrontado com uma pergunta direta sobre o seu filho ou filha.

Você deve agir com calma e sobretudo com dignidade. Certamente que o seu filho pela sua responsabilidade e competência é um exemplo para muitos outros, pelo que você deverá sentir-se orgulhoso dele.

Contudo, deverá ter em conta eventuais consequências para o seu filho se responder a essa questão de forma direta, e só deverá fazê-lo com o consentimento dele. De fato estamos perante um aspecto pessoal e ele, melhor do que ninguém, saberá quando e a quem responder a essa pergunta.

Se for você a falar sobre o assunto, faça-o só quando já estiver emocionalmente estabilizado(a) em relação à homossexualidade do seu filho e com as bases necessárias para poder esclarecer as dúvidas e os erros de apreciação dos outros, quer sejam família, amigos ou vizinhos. Se você próprio não estiver ainda emocionalmente estabilizado(a) sobre a homossexualidade do seu filho, acabará invariavelmente por transmitir a sua insegurança aos outros e aumentará neles a sua tendência para o preconceito.

Note-se que na prática irá-se assumir perante os outros como um pai ou mãe de um homosseuxal. Ler um bocadinho sobre o processo de assumir dos homossexuais em si talvez ajude nesta situação.

Aceitamos a homossexualidade do nosso filho, mas será que ele não podia esconder as manifestações de afeto pelo outro?

Vamos dividir esta questão em duas partes e começar pelo fim.

O referir-se ao companheiro, ou namorado, do seu filho como o 'outro', revela que a sua aceitação do fato não é ainda total. Por outro lado, essa atitude de desdém para com o companheiro do seu filho, somente irá contribuir para aumentar o fosso e a distância entre vocês e para tornar a todos mais infelizes.

Fora o clima de 'guerra fria', que em nada ajudará a cimentar suas relaçoes com seu filho.

Voltemos agora, à primeira parte da questão. E por que deveria o vosso filho esconder o seu afeto pelo companheiro? Será legítimo amar alguém e não o poder demonstrar? Um casal heterossexual quando passeia não se dá as mãos, por exemplo, como forma de afeto? Por que não o poderia fazer um casal homossexual, se o sentimento também é o mesmo?

Sou uma pessoa totalmente aberta e me é indiferente que o meu filho seja homossexual...

Será mesmo assim? Não se tratará antes de uma máscara? Uma forma de proteção?

Ao ser confrontado com as situações seguintes, como reagiria?

Sente-se confortável perto do companheiro do seu filho?

Se a resposta é NÃO, você deve se perguntar sobre os motivos desse desconforto. Se o companheiro fosse do sexo oposto aconteceria o mesmo? Não? Então a sua aceitação da homossexualidade do seu filho não parece ser muito verdadeira, não é?

A forma aberta como o seu filho revela os sentimentos pelo companheiro o incomoda?

Quando vê o seu filho beijar, abraçar ou dar a mão ao companheiro, sente-se embaraçado perante tal manifestação?

Se fosse com alguém do sexo oposto não acharia isso perfeitamente natural? E você? Tenta manter a sua própria heterossexualidade como um segredo? Obviamente que não! Então por que razão o seu filho deveria esconder a sua homossexualidade e os seus sentimentos? Se tal situação ainda o perturba, talvez tenha um problema em relação à homossexualidade do seu filho.

Acha horrível e desajustada a ideia do seu filho viver junto com o companheiro?

Não lhe parecera natural que o seu filho possa viver com o companheiro adulto que ama e escolheu? Não é natural que duas pessoas que se amam queiram partilhar a sua vida?

Tem problemas em pensar no seu filho fazendo amor com o companheiro?

Tenha sempre presente que as práticas sexuais entre os casais de homossexuais nada têm de anormal ou perverso. Sente-se preocupado com as práticas sexuais dos casais heterossexuais? Se estas práticas não o preocupam como o preocupam as práticas sexuais do seu filho com o companheiro, então talvez seja altura de dedicar alguns momentos ao assunto. A relação sexual entre os dois membros do casal homossexual não é o resultado natural da expressão do seu amor um pelo outro? Se acha que tal não é o caso, isso será indicador da existência de um problema com a homossexualidade em si.

As palavras "homossexual", "gay" ou "viado" incomodam-no?

Se tal é o caso, pare e pense porquê. Provavelmente tal fica a dever-se ao fato destas palavras terem más conotações para si. De onde vêm essas conotações? Terão aplicação no seu filho? O seu filho será mesmo igual a outros homossexuais? Então qual a razão de ser das conotações negativas?

Não se esqueça que se respondeu SIM a alguma das situações anteriores, então é porque não aceita tanto a homossexualidade do seu filho como imagina. Tem ainda trabalho a fazer...

Mas, sendo homossexual não irá ele pegar AIDS?

Esta é a parte má de toda a "história". Efetivamente a AIDS não é uma epidemia que afeta exclusivamente os homossexuais, mas de fato assumiu no seu início um maior impacto nesse grupo. A razão principal para este fato é que entre homens que tinham sexo com vários parceiros não havia razões para utilizar o preservativo, ao contrário do que acontecia com os heterossexuais com múltiplos parceiros (em que a razão de utilização do preservativo era quase exclusivamente como anti-concepcional).

O seu filho não tem obviamente de fazer parte deste cenário (quer seja homossexual ou não).

Se a banalização pelo sexo com o "use camisinha" que vemos em todo lugar esquece uma série de outras doenças, o ignorar da necessidade da sua utilização mesmo em encontros entre jovens pode ser um erro grave. Estatísticas recentes (2001) demonstram que a maioria dos casos de infecção do HIV entre jovens homossexuais são precisamente em relações estáveis, onde relaxa-se no cuidado. Cumpra seu papel de pai e mãe e eduque seu filho.

Principalmente, tenha sempre em mente o seguinte:

Não censure continuamente

Saiba exprimir com amor a sua preocupação, mas não esteja sempre falando no assunto.
Parecerá que está dissimuladamente tentando "curá-lo" da sua homossexualidade. Esta
será uma maneira certa de perder influência.

Informe-se sobre os fatos

Informe-se sobre a AIDS e outras doenças sexualmente transmissíveis para melhor poder
esclarecer o seu filho e a si próprio.

Apóie o seu filho

Encoraje no seu filho, de forma autêntica, para a existência de uma relação monogâmica de
longa duração, e à utilização do preservativo na mesma. Esse encorajamento permitirá
não só o semear das fontes do seu crescimento emocional, como também contribuirá
significativamente para reduzir as hipóteses dele vir a ficar infectado pelo HIV ou outra
doença sexualmente transmissível.

Não proíba...

Diz o povo que o "fruto proibido é o mais gostoso". O seu filho terá relações sexuais
independentemente de o proibir ou não e proibi-lo somente aumentará a sua determinação
em ir além da proibição. O caso será mais difícil ainda se o seu filho for adolescente, pois
achar-se-à invariavelmente imortal e sempre bem protegido e que a AIDS só ataca os
outros. A única maneira de quebrar este tipo de raciocínio é, conforme já referimos,
conhecer os fatos e educar o seu filho para o amor, encorajando os comportamentos
que lhe permitam crescer emocionalmente sem se colocar em risco.

Para tudo isto, é preciso tempo, esforço e empenhamento, mas não será o seu filho ou filha merecedor disso?

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